O lado B da questão
O estereótipo da juventude agente da violência
Rafaela Bez
No dia primeiro de julho de 2012, em uma confraternização da Torcida Organizada Fúria Independente, três carros em alta velocidade passam. Inesperadamente, ocupantes do veículo começaram a disparar tiros incansavelmente, em direção de um grupo que estava conversando tranquilamente no local. A rua estava bloqueada. Dos 15 tiros lançados, somente um foi certeiro, aquele que foi disparado na cabeça do irmão do auxiliar de produção, Alisson Raab Gonciero. Seu irmão, Diego Henrique Raab Gonciero, não resistiu e faleceu. Os noticiários afirmam: morre mais um jovem, apenas mais um. “É impressionante, para a sociedade e a mídia, meu irmão foi apenas mais um. Casos assim tornam a violência exacerbada cada vez mais comum em nosso meio”, afirma Alisson.
A questão da juventude e da violência é debatida pela sociedade de maneira parcial e não leva em conta aspectos estruturais, como o meio em que esses jovens vivem; seus parâmetros sociais, econômicos e familiares. Segundo o sociólogo e colaborador do Centro de Pesquisa e Apoio ao Trabalhador (Cepat), Jonas Jorge da Silva, ao se discutir sobre juventude e criminalidade, deve-se levar em conta, principalmente, a visão que o jovem tem sobre o problema. “De nada adianta discutirmos sobre juventude e criminalidade, sem antes ouvirmos a voz desses jovens. Daqueles que estão calados e ocultos perante a grande massa de informação. Ouvindo-os, o debate será, enfim, verdadeiro”, afirma.
MAPA DA VIOLÊNCIA
De 92 países participantes do ranking de homicídios entre crianças e adolescentes, o Brasil é o 4º colocado. Ao analisar os estados brasileiros, o Paraná ocupa a 9ª colocação, sendo que sua capital é a 6ª mais violenta do país, com uma taxa de 55,9 homicídios para cada 100 mil habitantes. Em dez anos, mais de 526 mil jovens foram exterminados: isso equivale à soma das populações de Piraquara, Pinhais, Fazenda Rio Grande e Colombo, cidades da Região Metropolitana de Curitiba. Homicídio, acidente de trânsito e suicídio. Juntos, esses três fatores são responsáveis por 62,8% das mortes dos jovens brasileiros. Em 2010, 26.854 mil jovens entre 15 e 29 anos, foram vítimas de homicídio, ou seja, 53,5% do total. A chance de um jovem entre 15 e 29 anos morrer é 2,5% mais alta do que um adulto. É o que revela estudo do Ministério da Justiça feito em colaboração com o Instituto Sangari.
Mas, afinal, porque o jovem é visto como causador da violência, sendo que é a maior vítima? “Falta ainda, em nossa sociedade, uma compreensão da juventude: ela não é reconhecida como agente, nem na diversidade de seus grupos atuantes. Precisamos apostar em ações afirmativas e de políticas públicas que contemplem os (as) jovens. As políticas públicas de juventude buscam avançar para além de temas, como violência ou sexualidade e combater o estereótipo que quer criminalizar a juventude”, ressalva o articulador da Casa da Juventude do Paraná (associação sem fins lucrativos de apoio à evangelização da juventude, promoção de vida, inserção social, defesa dos direitos fundamentais e lutas pela efetivação das políticas públicas para a juventude), Geraldo Paulo Pires.
A juventude que morre hoje tem um perfil, sabe-se que sexo ela tem, de onde vem e onde mora. O jovem exterminado hoje é negro, do sexo masculino e morador da periferia. Em dados, 74,6% dos jovens assassinados são negros, e 91,3% das vítimas de homicídio são do sexo masculino. “A juventude está sendo exterminada. A maioria dos jovens não está morrendo mais devido a fatores naturais, estão morrendo devido às drogas, as armas e os acidentes de trânsito”, ressalta Pires.
É difícil pensar em uma realidade comum entre os jovens, já que a juventude tem consigo a diversidade e as diferentes formas de expressão. “Um dos fatores em comum entre a juventude é a criminalização do jovem. Um jovem que comete delitos é julgado como marginal, mesmo se não conhecesse sua realidade e os fatores que o levaram a incumbir tal ato”, diz a advogada Tailaine Cristina Costa. “A sociedade vive hoje uma realidade individualista, sendo que esse individualismo leva as pessoas ao desequilíbrio”, afirma Pires.
Segundo sociólogos, a cultura da paz deve ser construída com o jovem, e não para o jovem. “A cultura do bem-viver nada mais é do que debater questões e conhecer o lado da juventude, sabendo suas necessidades e o que ela faz”. A cultura da paz é uma cultura pouco debatida e é uma maneira de se viver integrado com as pessoas e com o espaço em que se vive. Uma cultura em que não se aprenda a revidar, mas sim, a dialogar com as pessoas, estabelecendo assim, uma relação mais harmônica com o meio.
Rafaela Bez é estudante de jornalismo em Curitiba - PR
Contato: [email protected]