Enviado por PJMP em qui, 04/02/2016 - 15:11
Por Camila Ignácio, de Florianópolis, para Desacato.info.
Hoje, dia 29 de janeiro, completam 30 dias da morte de Vitor Pinto, bebê indígena assassinado na rodoviária de Imbituba. O inquérito da Polícia Civil sobre o caso terminou na terça-feira, dia 27, e foi enviado ao Poder Judiciário o mandado de prisão do jovem de 23 anos identificado como autor do assassinato. No processo, o crime não é identificado como de ódio contra raça, cor ou classe social. Essa colocação causou revolta no povo Kaingang, que diariamente enfrenta a raiva e o preconceito de grande parte da população do Sul do país.
“É providencial que se diga que não foi um crime de ódio, que o rapaz estava com distúrbios mentais. Mas, se ele escolheu o Vitor e não qualquer outro para matar, isso aconteceu porque a mídia hegemônica criou uma imagem tão ruim dos Kaingang que faz a população desconsiderar completamente o fator humano dessas pessoas. Foi mais fácil matar o Vitor, pois para o assassino, ele era um lixo”, vocifera Joziléia Daniva Kaingang, mestranda de antropologia e Kaingang natural da terra indígena Serrinha, do Rio Grande do Sul.
Os Kaingang são o terceiro maior povo indígena do país, e o maior de Santa Catarina. Eles vivenciam crimes constantes: piadas racistas, violência e xingamentos. Na mídia do estado, são geralmente colocados como um estorvo, pessoas que bloqueiam a BR-101 no Morro dos Cavalos ou que roubam a terra dos agricultores no Oeste. Sobre a morte de Vitor e a violência dos outros indígenas, pouco se fala. Sobre sua história, muito menos.
Originalmente, eles são um povo que foi ocupando planícies e montanhas. Os Kaingang sempre tiveram uma residência fixa e outras de passagem e, dessa forma, se movimentavam para os locais com mais alimento, sempre retornando ao ponto inicial. Atualmente, em Santa Catarina, estão mais concentrados na região Oeste e nas periferias do estado. “Quando falam sobre os indígenas aqui, querem aqueles de novela, estereotipados. O indígena sem reconhecimento acaba ainda mais marginalizado”, diz Joziléia. E mesmo depois de muito tempo, a movimentação desse povo continuou: ela acontece com a venda de artesanato nos litorais gaúcho e catarinense na época de verão.
Sobre a tristeza que permanece após a morte de Vitor e os constrangimentos vividos pelo povo originário dessa terra, a Kaingang completa: “A mídia não pode esperar por desastres para corrigir o ódio que colocou nas entrelinhas durante tantos anos. Nós prezamos pelas crianças, cuidamos de nossas crianças. Os filhos são como primogênitos de toda a rede de parentesco que se constitui entre eles. Todo amor que se tem por um filho, se tem por um sobrinho. A perda de uma criança é sempre um crime muito violento, mas para nós Kainkang, isso é muito mais do que vocês brancos podem imaginar. Se fosse o filho de um agricultor morto por um de nós, a reação dos brancos seria muito maior.”
Fotos por Zé Carlos Borges.