Vivemos momentos de intensa partilha de experiências e refletimos os desafios de sermos Igreja no mundo urbano. O encontro aconteceu nos dias 22 e 23 de Abril e reuniu aproximadamente trezentos participantes. Quatro quintos são mulheres, numa pesquisa feita por contraste. Vindas da maioria das vinte sete paróquias que formam a diocese de Foz do Iguaçu. O convite para a assessoria veio de Juvilde, coordenadora paroquial e de Padre João e chegou até a mim, através de nossa proximidade nas CEBs e do reconhecimento que eles têm pelo CEBI. Fui acolhido na casa de Ari e Clair, um casal religioso e que tem uma família linda. Acolheram-me como irmão. Gratidão.
O momento é instigante e repleto de desafios e possibilidades. Para a Igreja, especialmente, mas também para toda a sociedade. É interessante perceber que, mesmo em si tratando de um Estado como o Paraná, politicamente conservador, os impactos do golpe contra à democracia, estão à flor da pele. A ponto de legitimar um governo frágil eticamente, como o governo do Beto Richa, imerso em inúmeras denúncias de corrupção, e cuja opção de classe privilegia descaradamente os ricos, a conjuntura política ocupa as primeiras páginas no imaginário das pessoas. São os poderosos, de ontem e de hoje, oprimindo, explorando e gerando morte. Nada mal, na verdade, cenário perfeito para falar de Maria de Nazaré, que, para cujo Deus, disse: “Eis aqui a serva do Senhor” (Lc 1,38); que nela fez maravilhas (Lc 1, 45) e que despediu de mãos vazias os poderosos, (Lc 1,53). O nosso Sábado foi assim. Cantamos com muito fervor. “Eu amo a minha Mãe, Madroeira das massas. Eu amo a minha Mãe, Mãe de todas as raças”[1].
Perguntamo-nos e juntos/as nos respondemos às perguntas: “Qual é a Maria que você mais chama?” e ainda: “Qual é a Maria que você chama primeiro?”. Foi lindo ouvir tantos nomes ao mesmo tempo num coro uníssono. Segundo (GALVÃO, 2000, p 3). “No Brasil, reconhecem-se de “a” a “z” cerca de 120 invocações, entre elas, Nossa Senhora da Ajuda, do Desterro, das Candeias, das Graças, da Esperança, Aparecida, do Rosário, dos Navegantes, e assim vai”. Bonito poder sentir a presença e a intercessão da Mãe de Jesus e nossa Mãe na vida de tanta gente! Afinal, como diz a Irmã Lucimara, em artigo da Revista Voz da Igreja, da Arquidiocese de Curitiba, “Neste ano de 2017 estamos vivenciando o ano Nacional Mariano, justamente para fazermos memória dos 300 anos do encontro da imagem de Nossa Senhora Aparecida”. E conclui a irmã, “Queremos louvar Maria sob o título de Nossa Senhora Aparecida e aprender com ela o amor pela Santíssima Trindade e o Reino de Deus”. As CEBs são Marianas e perseguem ser este jeito samaritano de ser Igreja. O CEBI vem dando significativa contribuição para o reconhecimento da mulher na Bíblia, na Igreja e na sociedade. Seja através das inúmeras publicações, seja promovendo seminários sobre Bíblia e feminino. O Povo de Deus reconhece e valoriza tudo isso e aprende ao ensinar que temos a mesma dignidade. Pois, “E Deus criou o ser humano à sua imagem, à imagem de Deus ele o criou, macho e fêmea os criou” (Gn 1, 27).
Além da significativa presença de representantes da maioria das Paróquias: coordenadores/as de diversas pastorais, catequistas, ministros/as da Eucaristia, padres, contamos com a presença de Dom DirceuVegini, Bispo da Diocese de Foz do Iguaçu que permaneceu por quase todo o encontro, saindo apenas para celebrar na catedral no final do Domingo. Toda a comunidade se alegrou grandemente com a sua presença-participação. O nosso segundo tema, sobre o qual refletimos no Domingo, foi “Os desafios das CEBs no mundo urbano”, assunto central e Tema Gerador do Décimo Quarto Intereclesial que acontecerá em Londrina-PR, de 23 a 27 de Janeiro de 2018. Teremos como lema: “Eu vi e eu ouvi os clamores do meu povo e desci para libertá-lo” (Ex 3,7). Tão proféticas quanto as palavras de Dom Dirceu, são as palavras de Dom Orlando Brandes, que corajosa e ousadamente disse sim à vinda do Décimo Quarto Intereclesial para Londrina. Na apresentação do Texto Base assim diz ele, “A Igreja direcionada e pautada pelo Reino de Deus, caminha em frente, vai além, sempre “em saída”. Para tanto, todos precisamos de lucidez e esperança, paciência e criatividade, coragem e humildade”. Oxalá, todos/as aprendamos com Dom Orlando a ouvir, mais do que falar. Dom Orlando foi eleito pelo Papa Francisco Arcebispo de Aparecida, mas, além de suas orações, contamos com a mística, o carisma e a espiritualidade trinitárias de Dom Manuel João Francisco a quem foi dada a graça de administrar a Diocese vacante de Londrina.
O mundo urbano é o grande desafio que espreita toda a Igreja e nos espreita como Igreja. Pois, como nos diz David Harvey, “Mas, se a cidade é o mundo que o homem criou, é também o mundo onde ele está condenado a viver daqui por diante”. Aproximadamente 85% da população brasileira moram na cidade. E os outros 15%, apesar de morar na área rural, adquiriram hábitos urbanos. Com a chegada da energia elétrica, da telefonia móvel, da TV à cabo e da internet, chegou a cultura urbana. Isto significa, muitas vezes, a chegada da “globalização da indiferença” e as “periferias existências” já denunciadas pelo Papa Francisco. Temos que nos manter próximos à poesia profética contida no lema da Campanha da Fraternidade de 2016, “Quero ver o direito brotar como fonte e correr a justiça qual riacho que não seca” (Amós 5,24). O Direito, a Justiça e a Liberdade são as colunas que sustentam a promessa de uma vida em abundância. As três palavras sofrem hoje de uma anemia profunda no seu significado.
O Papa João Paulo II, ao escrever a Exortação Apostólica, Christifideles Laici, viu com profecia a realidade dos pobres nas cidades quando disse, “Enormes manchas de pobreza e de miséria, ao mesmo tempo física e moral, erguem-se ao lado das grandes metrópoles e ferem de morte grupos humanos inteiros” (CL nº 5). É este jeito de ver a realidade de exclusão, sobretudo das cidades, que faz da Igreja Comunidade de Comunidades. “A família de Deus no mundo” como diz Bento XVI, (DCE, 25b), e acrescenta, “Nessa Família, não deve haver ninguém que sofra por falta do necessário”. Desta forma, quando a Igreja se isenta da política, ela está se isentando também do Evangelho. Afinal, o critério de salvação, em última instância, é a caridade vivida na capacidade de servir (Mt 25, 31-46). A realidade de opressão, de exclusão e de sofrimento dos pobres era o que mais deixava Jesus indignado. Para (ARAÚJO, 2017, p 110), “A sua principal preocupação não era o culto, mas o amor preferencial pelos pobres e excluídos (cf. Mt 25, 31-46; Lc 16, 19-31). Consequentemente, com a Igreja, como seguidora de Jesus, não pode ser diferente. Temos que semear. O Papa Francisco saiu a semear e já estão aí os frutos de sua semeadura. O que vem acontecendo com a CNBB, com a Igreja e com os Bispos é que estão colocando o Evangelho na cintura. E quando isso acontece, a profecia se faz.
Curitiba, 28 de Abril de 2017
– Sexta Feira de Greve Geral
– Fora Temer! Nenhum Direito a menos!
João Ferreira Santiago.
Teólogo, Poeta e Militante.
É membro-assessor das CEBs e do CEBI no Paraná.
Mestre em Teologia e Especialista em Assessoria Bíblica.
Autor do livro: “Gamela de Pedra” entre outros.
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Referências
- ARRUDA, Lúcia. Aquela que acreditou – A vida oculta de Maria de Nazaré. São Paulo: Paulus, 2017, p. 34/35.
BÍBLIA Sagrada Nova Bíblia Pastoral. São Paulo: Paulus, 2013.
GASS, Bohn Ildo e BARROS Odja. Re-imaginando a Trindade. São Leopoldo-RS: CEBI. 2015.
- BOFF, Clodovis, OSM. Introdução à Mariologia – Introdução á Teologia. Petrópolis-RJ: Vozes, 2004.
- DAVID HARVEY - Revista Piauí – Edição 82 - tribuna livre da luta de classes - Artigo O direito à cidade – Julho de 2013;
- GALVÃO, Antonio M. Maria de todos os dias. Revista O Recado n 168, Março/Abril/Maio, São Paulo: Lis Gráfica, 2000.
- Revista Voz da Igreja. Arquidiocese de Curitiba. Ano XIV – Edição 170 – Março de 2017.
- RODRIGUES, Solange S. (Org.). CEBs e Mundo Urbano – Perspectivas no pontificado de Francisco. Rio de Janeiro-RJ: ISER Assessoria/CNBB, 2016.
Sítios sugeridos:
www.cebi.org.br - www.pjmp.org - www.cnbb.org.br - www.cebsdobrasil.com.com.br
[1] Refrão da música “Mãe, Madroeira das Massas” de autoria de João Santiago.
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